28 de dezembro de 2009

Natal dos “Sem Abrigo”

Tudo começou naquela tarde fria do dia 24 de Dezembro de 2008. Eu decidira que era naquele dia que iria servir aqueles que são excluídos da sociedade, incluindo cada um de nós, mesmo que seja só por inacção, por não fazermos tudo para os reconquistar para serem reintegrados na sociedade. Ali estava eu, decidido a fazer a diferença em mim mesmo e, pela primeira vez, a fazer algo que o meu coração exigia: dar um pouco do meu tempo e da minha dedicação para servir os designados “sem-abrigo”. Sabia que, até para os meus familiares, iria parecer estranho sair àquela hora, quando todos costumamos jantar juntos, pois sempre fazemos questão de, nesse dia estarmos junto de quem nos faz feliz. No entanto decidi que o faria e em segredo. 
Saí de casa ao inicio da tarde e, sem saber onde se realizaria o jantar de Natal dos “sem-abrigo”, lá fui eu perguntando pelo local onde, em Guimarães, diariamente se servem refeições “económicas”, as também denominadas refeições sociais. Informaram-me que o jantar não se iria realizar ali, mas sim num antigo albergue, situado numa transversal à rua da Rainha Dona Maria II. Lá cheguei a esse tal albergue e perguntei se era ali que iria ter lugar o tal jantar. O responsável desse albergue respondeu-me que sim e, depois de eu fazer questão de ajudar no que fosse necessário, lá me disse para aparecer às 18h00, embora já tivesse pessoas suficientes para ajudar a servir o jantar. Apareci à hora marcada e lá fui eu, fazer aquilo que o meu coração mandava. Tudo era novidade: as instalações, as pessoas, as tarefas, a incerteza da hora a que terminaria o jantar… mas nada disso era importante, pois a minha missão era a coisa mais importante: servi-los. Foi uma experiência que me mudou e muito! Ainda hoje, é daqueles acontecimentos que, embora ainda só tenha participado duas vezes, é dos que mais me emociona e faz bem à alma. Faço-o porque eles (os “sem-abrigo”) me devolvem muitíssimo mais do que eu lhes dou, ao servir-lhes a refeição com toda a dedicação. É um momento mágico, pois há gestos que eles têm que nos lembram que as suas chagas, embora sejam profundas, nesse dia elas parecem aliviadas e a sua dor adormecida. Talvez eu tenha a esperança de que, num jantar destes, consigamos “recuperar” alguns deles. A vida é mesmo uma caixinha de surpresas. Como é possível imaginar que, ao servirmos aqueles que são marginalizados pela sociedade alcançamos paz de espírito e alegria? Mesmo quando percebemos que alguns deles, ao primeiro contacto que têm connosco, reagem de uma forma um pouco ríspida e desconfiada perante a nossa disponibilidade para os servir, se persistirmos em lhes mostar amor e espírito de serviço desinteressado, eles acabam por perceber isso. Quando isto sucede, sentimos que nos devolvem o respeito e o reconhecimento que constituem o combustível que mantém a chama do amor pelo próximo muito mais forte e persistente dentro de nós. Confesso que, das actividades em que participei até hoje no grupo “Diálogos”, a que mais me cativa e emociona é o jantar de Natal dos “sem abrigo”. Sinto que tenho muito a aprender em relação a outras actividades que o grupo desenvolve, mas esta dá--me uma enorme alegria. O amor é universal, intemporal e transversal e posso afirmar com segurança que o amor que se cultiva em gestos como estes, servem de incentivo para nos tornarmos melhores e ajudar outras pessoas a ver o mundo de outra forma. Os jantares de Natal que lhes proporcionamos são gestos isolados e descontínuos de amor, mas tenho a esperança de um dia integrar uma organização que lhes proporcione ajuda de forma mais contínua e consistente. É isto que significa para mim o jantar de Natal dos sem-abrigo: uma oportunidade de conhecer um pouco melhor o sentido da palavra que reina e ilumina o mundo: o AMOR.
Se me é permitido, gostaria de declarar publicamente o meu mais sincero e profundo agradecimento a todos os “sem abrigo” que, sem se aperceberem disso, me ajudaram a começar a perceber o que significa “amar o próximo” bem como outras formas de amar.

P.C.

Sem comentários: